terça-feira, 4 de janeiro de 2011

A VIDA VERDADEIRA

Pois aqui está a minha vida.
Pronta para ser usada.
Vida que não guarda
nem se esquiva, assustada.
Vida sempre a serviço
da vida.
Para servir ao que vale
a pena e o preço do amor

Ainda que o gesto me doa,
não encolho a mão: avanço
levando um ramo de sol.
Mesmo enrolada de pó,
dentro da noite mais fria,
a vida que vai comigo
é fogo:
está sempre acesa.

Vem da terra dos barrancos
o jeito doce e violento
da minha vida: esse gosto
da água negra transparente.

A vida vai no meu peito,
mas é quem vai me levando:
tição ardente velando,
girassol na escuridão.

Carrego um grito que cresce
Cada vez mais na garganta,
cravando seu travo triste
na verdade do meu canto.

Canto molhado e barrento
de menino do Amazonas
que viu a vida crescer
nos centro da terra firme.
Que sabe a vinda da chuva
pelo estremecer dos verdes
e sabe ler os recados
que chegam na asa do vento.
as sabe também o tempo
da febre e o gosto da fome.

Nas águas da minha infância
perdi o medo entre os rebojos.
Por isso avanço cantando
Estou no centro do rio
estou no meio da praça.
Piso firme no meu chão
sei que estou no meu lugar,
como a panela no fogo
e a estrela na escuridão.

O que passou não conta ?, indagarão
as bocas desprovidas.
Não deixa de valer nunca.
que passou ensina
com sua garra e seu mel.

Por isso é que agora vou assim
no meu caminho. Publicamente andando
Não, não tenho caminho novo.
O que tenho de novo
é o jeito de caminhar.
Aprendi
(o que o caminho me ensinou)
a caminhar cantando
como convém
a mim
e aos vão comigo.

Pois já não vou mais sozinho.

Aqui tenho a minha vida:
feita à imagem do menino
que continua varando
os campos gerais
e que reparte o seu canto
como o seu avô
repartia o cacau
e fazia da colheita
uma ilha do bom socorro.

Feita à imagem do menino
mas a semelhança do homem:
com tudo que ele tem de primavera
de valente esperança e rebeldia.

Vida, casa encantada,
onde eu moro e mora em mim,
te quero assim verdadeira
cheirando a manga e jasmim.
Que me sejas deslumbrada
como ternura de moça
rolando sobre o capim.

Vida, toalha limpa
vida posta na mesa,
vida brasa vigilante
vida pedra e espuma
alçapão de amapolas,

sol dentro do mar,
estrume e rosa do amor:
a vida.

Há que merecê-la


(Esta é uma de minhas poesias preferidas, de meu poeta preferido: Thiago de Mello)



Um comentário:

Antónia Ruivo disse...

Um bonito Poema que nos transmite a calma da sabedoria, um feliz 2011, beijinhos
http://porentrefiosdeneve.blogspot.com/