sábado, 29 de janeiro de 2011

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

"Tenho várias caras. Uma é quase bonita, a outra é quase feia. ou um o quê?
Um quase tudo... Não me sinto bem. Não sei o que é que há.
Mas alguma coisa está errada e dá mal-estar.
No entanto estou sendo franca e meu jogo é limpo
Abro o jogo!
Só não conto os fatos de minha vida:
sou secreta por natureza!!!"

(Clarice Lispector)

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

AINDA UMA VEZ ADEUS

                      I
Enfim te vejo! - enfim posso,
Curvado a teus pés, dizer-te,
Que não cessei de querer-te,
Pesar de quanto sofri.
Muito penei! Cruas ânsias,
Dos teus olhos afastado,
Houveram-me acabrunhado
A não lembrar-me de ti!
                      II
Dum mundo a outro impelido,
Derramei os meus lamentos
Nas surdas asas dos ventos,
Do mar na crespa cerviz!
Baldão, ludíbrio da sorte
Em terra estranha, entre gente,
Que alheios males não sente,
Nem se condói do infeliz!
                      III
Louco, aflito, a saciar-me
D'agravar minha ferida,
Tomou-me tédio da vida,
Passos da morte senti;
Mas quase no passo extremo,
No último arcar da esperança,
Tu me vieste à lembrança:
Quis viver mais e vivi!
                      IV
Vivi; pois Deus me guardava
Para este lugar e hora!
Depois de tanto, senhora,
Ver-te e falar-te outra vez;
Rever-me em teu rosto amigo,
Pensar em quanto hei perdido,
E este pranto dolorido
Deixar correr a teus pés.
                      V
Mas que tens? Não me conheces?
De mim afastas teu rosto?
Pois tanto pôde o desgosto
Transformar o rosto meu?
Sei a aflição quanto pode,
Sei quanto ela desfigura,
E eu não vivi na ventura...
Olha-me bem, que sou eu!
                      VI
Nenhuma voz me diriges!...
Julgas-te acaso ofendida?
Deste-me amor, e a vida
Que me darias - bem sei;
Mas lembrem-te aqueles feros
Corações, que se meteram
Entre nós; e se venceram,
Mal sabes quanto lutei!
                      VII
Oh! se lutei!... mas devera
Expor-te em pública praça,
Como um alvo à populaça,
Um alvo aos dictérios seus!
Devera, podia acaso
Tal sacrifício aceitar-te
Para no cabo pagar-te,
Meus dias unindo aos teus?
                      VIII
Devera, sim; mas pensava,
Que de mim t'esquecerias,
Que, sem mim, alegres dias
T'esperavam; e em favor
De minhas preces, contava
Que o bom Deus me aceitaria
O meu quinhão de alegria
Pelo teu, quinhão de dor!
                      IX
Que me enganei, ora o vejo;
Nadam-te os olhos em pranto,
Arfa-te o peito, e no entanto
Nem me podes encarar;
Erro foi, mas não foi crime,
Não te esqueci, eu to juro:
Sacrifiquei meu futuro,
Vida e glória por te amar!
                      X
Tudo, tudo; e na miséria
Dum martírio prolongado,
Lento, cruel, disfarçado,
Que eu nem a ti confiei;
"Ela é feliz (me dizia)
"Seu descanso é obra minha."
Negou-me a sorte mesquinha...
Perdoa, que me enganei!
                      XI
Tantos encantos me tinham,
Tanta ilusão me afagava
De noite, quando acordava,
De dia em sonhos talvez!
Tudo isso agora onde pára?
Onde a ilusão dos meus sonhos?
Tantos projetos risonhos,
Tudo esse engano desfez!
                      XII
Enganei-me!... - Horrendo caos
Nessas palavras se encerra,
Quando do engano, quem erra.
Não pode voltar atrás!
Amarga irrisão! reflete:
Quando eu gozar-te pudera,
Mártir quis ser, cuidei qu'era...
E um louco fui, nada mais!
                      XIII
Louco, julguei adornar-me
Com palmas d'alta virtude!
Que tinha eu bronco e rude
C'o que se chama ideal?
O meu eras tu, não outro;
Stava em deixar minha vida
Correr por ti conduzida,
Pura, na ausência do mal.
                      XIV
Pensar eu que o teu destino
Ligado ao meu, outro fora,
Pensar que te vejo agora,
Por culpa minha, infeliz;
Pensar que a tua ventura
Deus ab eterno a fizera,
No meu caminho a pusera...
E eu! eu fui que a não quis!
                      XV
És doutro agora, e pr'a sempre!
Eu a mísero desterro
Volto, chorando o meu erro,
Quase descrendo dos céus!
Dói-te de mim, pois me encontras
Em tanta miséria posto,
Que a expressão deste desgosto
Será um crime ante Deus!
                      XVI
Dói-te de mim, que t'imploro
Perdão, a teus pés curvado;
Perdão!... de não ter ousado
Viver contente e feliz!
Perdão da minha miséria,
Da dor que me rala o peito,
E se do mal que te hei feito,
Também do mal que me fiz!
                      XVII
Adeus qu'eu parto, senhora;
Negou-me o fado inimigo
Passar a vida contigo,
Ter sepultura entre os meus;
Negou-me nesta hora extrema,
Por extrema despedida,
Ouvir-te a voz comovida
Soluçar um breve Adeus!
                      XVIII
Lerás porém algum dia
Meus versos d'alma arrancados,
D'amargo pranto banhados,
Com sangue escritos; - e então
Confio que te comovas,
Que a minha dor te apiade
Que chores, não de saudade,
Nem de amor, - de compaixão.


Antônio Gonçalves Dias , nasceu em Caxias/RJ em 10 de agosto de 1823 e faleceu em Guimarães, em 3 de novembro de 1864.
Foi um poeta e teatrólogo brasileiro.




segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

SONETO INASCIDO

O poema subjaz.

Insiste sem existir

escapa durante a captura

vive do seu morrer.

O poema lateja.

É limbo, é limo,

imperfeição enfrentada,

pecado original.

O poema viceja no oculto

engendra-se em diluição

desfaz-se ao apetecer.

O poema poreja flor e adaga

e assassina o íncubo sentido.

Existe para não ser.

(Arthur da Távola)

sábado, 15 de janeiro de 2011

MATA, ARRASA E LEVA EMBORA

É a lama, é a lama. Poço Fundo, o sítio da família de Tom Jobim na pequena São José do Vale do Rio Preto, RJ, também foi parcialmente destruído pelas enchentes da região serrana. O rio que dá nome à cidade transbordou e arrastou casas, árvores e animais às suas margens, inclusive na propriedade que foi inspiração e cenário de, entre tantas canções de Tom, "Águas de Março" (1972).

A letra do samba está cheia de imagens proféticas: é pau, é pedra, é o fim do caminho; é a chuva chovendo, é o fundo do poço, é a noite, é a morte; no rosto o desgosto, é um pouco sozinho -embora, na origem, o poeta estivesse descrevendo as águas que, fechando o verão, lavavam a alma e eram uma promessa de vida no coração do ouvinte.

Mais cruel ainda é saber que o delicioso "riachinho de água esperta", da letra de "Chovendo na Roseira" (1970), também se tomou de fúria destruidora ao se lançar no vasto rio de águas (não mais) calmas. E, em vez da "chuva boa,/ criadeira,/ que molha a terra,/ que enche o rio,/ que lava o céu,/ que traz o azul", veio aquela que, com a ajuda da imprevidência humana, mata, arrasa e leva embora.


Tom via a chuva como uma força benigna, regeneradora. Outro exemplo está na letra de "Correnteza" (1975), dele com Luiz Bonfá: "Depois da chuva passada/ Céu azul se apresentou/ Lá à beira da estrada/ Vem vindo o meu amor...". Não que ele desprezasse a força da natureza quando provocada: "Cadê meu caminho, a água levou/ Cadê meu rastro, a chuva apagou/ E a minha casa, o rio carregou", escreveu em "Passarim" (1985).

Tom bem que fez a sua parte. Ao assumir a direção do sítio, cerca de 1970, propôs-se a ressuscitar a mata nativa da região, praticamente destruída. Quase metade dela se recuperou. Mas não houve tempo para que aquela terra, tão rica de música e poesia, se salvasse da correnteza cega e surda.


(Ruy Castro - Jornal Folha de São Paulo
Rio de Janeiro, 15 de janeiro de 2011)

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

COMO SER UMA BOA MOÇA

As frases abaixo são dos anos 50, 60 e insuportáveis para os dias de hoje. E pensar que as revistas QUERIDA, CLÁUDIA eram modernas...


* Não se deve irritar o homem com ciúmes e dúvidas. (Jornal das Moças, 1957);

* Se desconfiar da infidelidade do marido, a esposa deve redobrar seu carinho e provas de afeto. (Revista Cláudia, 1962);

* A desarrumação numa casa-de-banho desperta no marido a vontade de ir tomar banho fora de casa. (Jornal das Moças, 1965);

* A mulher deve fazer o marido descansar nas horas vagas. Nada de incomodá-lo com serviços domésticos. (Jornal das Moças, 1959);

* Se o seu marido fuma, não arranje zanga pelo simples facto de cair cinzas nos tapetes. Tenha cinzeiros espalhados por toda casa. (Jornal das moças, 1957);

* A mulher deve estar ciente, que dificilmente um homem pode perdoar a uma mulher que não tenha resistido a experiências pré-nupciais, mostrando que era perfeita e única, exactamente como ele a idealizara. (Revista Cláudia, 1962);

* Mesmo que um homem consiga divertir-se com sua namorada ou noiva, na verdade ele não irá gostar de ver que ela cedeu. (Revista Querida, 1954);

* O noivado longo é um perigo. (Revista Querida, 1953);

* É fundamental manter sempre a aparência impecável diante do marido. (Jornal das Moças, 1975);

E para finalizar, a mais de todas:

O lugar da mulher é no lar, o trabalho fora de casa masculiniza. (Revista Querida, 1955).


sábado, 8 de janeiro de 2011

QUEM É QUEM

Posso dizer: estou pronto

para me dar ao que vier.

Posso errar, mas não por medo

de me ser no que fizer.

Quem me pode responder

que sabe ser, sendo inteiro

fiel e simples, sendo a tudo

que faz e não quer fazer?

(Thiago de Mello)

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

A PRESIDENTE DE TODOS NÓS


Sai Lula, entra Dilma.

Sai um operário, entra uma mulher.

Sai a emoção, entra a razão, a técnica.

Mas, a mulher racional, técnica também é emoção e isso foi demonstrado em seu discurso de posse, quando ela se lembrou dos amigos que tombaram lutando pela ditadura. Uma ditadura que ela também lutou contra, sofreu, deu sua juventude.

Os desafios são grandes, os sonhos maiores.

Que essa mulher forte seja iluminada e ajude o povo a ser mais feliz, com educação, saúde e segurança.

Felicidades, Presidente!

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

A VIDA VERDADEIRA

Pois aqui está a minha vida.
Pronta para ser usada.
Vida que não guarda
nem se esquiva, assustada.
Vida sempre a serviço
da vida.
Para servir ao que vale
a pena e o preço do amor

Ainda que o gesto me doa,
não encolho a mão: avanço
levando um ramo de sol.
Mesmo enrolada de pó,
dentro da noite mais fria,
a vida que vai comigo
é fogo:
está sempre acesa.

Vem da terra dos barrancos
o jeito doce e violento
da minha vida: esse gosto
da água negra transparente.

A vida vai no meu peito,
mas é quem vai me levando:
tição ardente velando,
girassol na escuridão.

Carrego um grito que cresce
Cada vez mais na garganta,
cravando seu travo triste
na verdade do meu canto.

Canto molhado e barrento
de menino do Amazonas
que viu a vida crescer
nos centro da terra firme.
Que sabe a vinda da chuva
pelo estremecer dos verdes
e sabe ler os recados
que chegam na asa do vento.
as sabe também o tempo
da febre e o gosto da fome.

Nas águas da minha infância
perdi o medo entre os rebojos.
Por isso avanço cantando
Estou no centro do rio
estou no meio da praça.
Piso firme no meu chão
sei que estou no meu lugar,
como a panela no fogo
e a estrela na escuridão.

O que passou não conta ?, indagarão
as bocas desprovidas.
Não deixa de valer nunca.
que passou ensina
com sua garra e seu mel.

Por isso é que agora vou assim
no meu caminho. Publicamente andando
Não, não tenho caminho novo.
O que tenho de novo
é o jeito de caminhar.
Aprendi
(o que o caminho me ensinou)
a caminhar cantando
como convém
a mim
e aos vão comigo.

Pois já não vou mais sozinho.

Aqui tenho a minha vida:
feita à imagem do menino
que continua varando
os campos gerais
e que reparte o seu canto
como o seu avô
repartia o cacau
e fazia da colheita
uma ilha do bom socorro.

Feita à imagem do menino
mas a semelhança do homem:
com tudo que ele tem de primavera
de valente esperança e rebeldia.

Vida, casa encantada,
onde eu moro e mora em mim,
te quero assim verdadeira
cheirando a manga e jasmim.
Que me sejas deslumbrada
como ternura de moça
rolando sobre o capim.

Vida, toalha limpa
vida posta na mesa,
vida brasa vigilante
vida pedra e espuma
alçapão de amapolas,

sol dentro do mar,
estrume e rosa do amor:
a vida.

Há que merecê-la


(Esta é uma de minhas poesias preferidas, de meu poeta preferido: Thiago de Mello)



domingo, 2 de janeiro de 2011


"O Ano Novo ainda não tem pecado:

É tão criança...

Vamos embalá-lo...

Vamos todos cantar juntos em seu berço de mãos dadas,

A canção da eterna esperança."

(Mário Quintana)