segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

CENTENÁRIO DE ELIZABETH BISHOP


Elizabeth Bishop (Worcester, 8 de fevereiro de 1911 - 6 de outubro de 1979) é uma autora americana, considerada um das mais importantes poetas do século XX a escrever na língua inglesa.

O pai, William Thomas Bishop morreu antes de ter ela um ano e a mãe, Gertrude Bulmer Bishop, que sofria dos nervos, foi confinada a um asilo mental quando Elizabeth mal tinha cinco anos. A família materna a levou para viver em Great Village na Nova Escócia, Canadá.

Foi mais tarde educada pela família do pai em Worcester e Boston. Viveu nove meses infelizes com os avós paternos em Boston, como se vê em The Country House, começando a sofrer de asma e de eczema, a primeira de suas numerosas alergias. Viveu na França na década de 1920, graças a sua colega em Vassar e amante Louise Crane, herdeira da famosa indústria de papel. Estudaria em Vassar durante quatro anos - entrou em 1929, bem no ano da quebra de Wall Street.

Conheceu a grande poetisa Marianne Moore, 24 anos mais velha, de quem se tornou muito amiga. Seus primeiros poemas, muito influenciados por George Herbert, Gerard Manley Hopkins e Moore, surgiram na revista de Vassar College, que ajudou a fundar com Mary McCarthy, escritora um ano mais velha, Margaret Miller e duas irmãs Clark, e que se intitulava Con Spirito. Influenciada por Moore, abandonou a intenção de se tornar médica e se dedicou à poesia. Sua educação excelente era financiada por dinheiro aplicado pelo pai, que ia entretanto diminuindo com a inflação.

CARREIRA

Residiu em Nova Iorque por um ano, escrevendo poemas mais amadurecidos, entre eles The Map e The Man-Moth. Viveu depois intermitentemente na Europa por três anos, depois de comprar uma casa em Key West, Florida, em 1938. Depois de rejeições por alguns editores, o primeiro de seus volumes de poesia («North and South») apareceu em 1946. No ano seguinte conheceu Robert Lowell, de quem se tornou amiga durante o resto da vida.

Marianne Moore demonstrou grande interesse por seus trabalhos. Quatro anos se passara antes que Elizabeth começasse a chamá-la nas cartas Cara Marianne e a pedido de Moore! A amizade entre ambas, que perdura na extensa corresponência, durou até a morte de Moore em 1972. Em 1946, Moore sugeriu seu nome para o Houghton Mifflin Prize (prêmio de poesia) e ela venceu. Quando da publicação de North and South, o mais importante crítico de então na América, Randall Jarrell, escreveu que «all her poems have written underneath, I have seen it" ou seja, «todos seus poemas, como percebi, tem uma segunda escrita».

NO BRASIL

Bishop, que a vida toda teria dificuldades para sustentar sua carreira, dependia bastante de doações, empréstimos, prêmios e outros incentivos universitários. Em 1951, ao receber 2,500 dólares norte-americanos do Bryn Mawr College (importância então considerável) pode decidir-se a navegar ao redor da América do Sul. Chegou a Santos em Novembro, esperando ficar duas semanas, para desfrutar da paisagem numa curta pausa de sua semanas em sua longa viagem, mas sua estada se estendeu por mais de vinte anos.

O Brasil marcou sua vida como temática de numerosos poemas, contos e cartas, e, como afirma a obra «Brasiliana da Biblioteca Nacional», de 2001, em sua página 107, «como vivência afetiva, pautada sobretudo pela longa relação amorosa com Lota de Macedo Soares.» Tal amizade lhe daria estabilidade e amor e estabeleceu residência no Rio de Janeiro, depois nos arredores, em Petrópolis e mais tarde em Ouro Preto.

Diz a mesma obra: «Representante ilustre da poesia moderna norte-americana, Bishop residiu no Brasil como estrangeira voluntariamente exilada de seu país, mas profundamente conectada com o movimento cultural norte-americano», principalmente com o poeta Robert Loewe e com sua mentora Marianne Moore. (....) «Traduziu poemas dos principais expoentes do modernismo brasileiro e manteve relações cordiais com vários desses artistas.»

Chegou no último governo Vargas, documentou o suicídio do presidente, viu a ascensão de JK e a queda de Jango Goulart. Endossava as opiniões de sua namorada Lota, paisagista e amiga de Carlos Lacerda, partidária de posições udenistas. Com simpatias pelo Partido Democrata nos Estados Unidos, crítica ao sistema de segregação racial norte-americano, assumiu no Brasil uma posição antiesquerdista. A verdade é que a política jamais foi tema de interesse central para ela, não podendo ela ter uma maior compreensão teórica do assunto. Sua percepção das contradições brasileiras é, no entanto, sutil e perspicaz em poemas sobre a paisagem de Santarém, por exemplo, na evocação das chuvas tropicais, na sátira social explícita (poema Pink Dog, por exemplo) no retrato dos pobres urbanos.

RETORNO AOS ESTADOS UNIDOS

Vendendo a casa de Ouro Preto após o suicídio de Lota, no início da década de 1970 retornou defitinivamente aos Estados Unidos.

Enquanto vivia no Brasil, em 1956 recebeu o prêmio Pulitzer pelo livro «North & South — A Cold Spring». Receberia mais tarde o Prêmio Nacional do Livro (the National Book Award) e o prêmio nacional do círculo dos Críticos literários (the National Book Critics Circle Award) assim como duas bolsas Guggenheim e uma da Ingram Merrill Foundation. Tornou-se poeta residente na Universidade de Harvard em 1969. Começou em 1971 uma amizade íntima com Alice Methfessel que duraria até sua morte em 1979.

Em 1976, foi a primeira mulher a receber o International Neustadt Prize for Literature (prêmio internacional Neustadt de Literatura) e continua sendo o único americano a recebê-lo.

Escreveu muito para a revista The New Yorker, e em 1964 escreveu o obituário de Flannery O'Connor para a The New York Review of Books. Fazia muitas conferências, e durante uns poucos anos ensinou na Universidade de Washington, antes de se mudar para Harvard por sete anos. Ensinou ainda na New York University, antes de terminar seus dias de ensino no Massachusetts Institute of Technology.

Gastava meses, por vezes anos, escrevendo um poema apenas, trabalhando para obter um sentido de espontaneidade. Apaixonada pela exatidão, recriou os mundos do Canadá, América, Europa e Brasil. Não admitia ter pena de si mesma, mas seus poemas mal escondem todas as dificuldades como mulher, como lésbica, como órfã, como viajante sem raízes, ou asmática frequentemente hospitalizada, mulher que sofria de depressão e por vezes alcoolismo.

"I'm not interested in big-scale work as such," disse uma vez a Lowell. "Something needn't be large to be good." O que simplesmente quer dizer que não estava intressada por trabalho em larga escala, por não acreditar que algo precisasse ser grande para ser bom…


UMA ARTE
A arte de perder não tarda aprender;
tantas coisas parecem feitas com o molde
da perda que o perdê-las não traz desastre.

Perca algo a cada dia. Aceita o susto
de perder chaves, e a hora passada embalde.
A arte de perder não tarda aprender.

Pratica perder mais rápido mil coisas mais:
lugares, nomes, onde pensaste de férias
ir. Nenhuma perda trará desastre.

Perdi o relógio de minha mãe. A última,
ou a penúltima, de minhas casas queridas
foi-se. Não tarda aprender, a arte de perder.

Perdi duas cidades, eram deliciosas. E,
pior, alguns reinos que tive, dois rios, um
continente. Sinto sua falta, nenhum desastre.

- Mesmo perder-te a ti (a voz que ria, um ente
amado), mentir não posso. É evidente:
a arte de perder muito não tarda aprender,
embora a perda - escreva tudo! - lembre desastre.

Elizabeth Bishop (Tradução de Horácio Costa)

Um comentário:

Nárriman disse...

Ei Mima, estava com saudades!!!
Que poema, hein? E que vida sofrida a dela, já sem os pais desde cedo e ainda com esses problemas de saúde! Eu não conhecia a autora, fiquei com vontade ler mais textos dela.
Bjs !!!