sexta-feira, 18 de junho de 2010

HISTÓRIA DE UM CAMPEIRO ERRANTE

Já nascera na campanha,
sobre um carnal de pelego,
e, assim, desde borrego,
arrucinando na infância,
foi se criando, à distância,
repontando a liberdade,
vivendo a imensidade
dos campos grandes da estância.

Aprendera quase tudo,
sempre na lida campeira,
desde laçar, na mangueira,
um bagual para domar;
e, depois, lhe ensinar,
numa disputa tamanha,
que o homem é quem ganha,
pois sabe ouvir e pensar.

Aprendeu castrar cordeiros,
depois terneiros e potros;
e até já ensinava aos outros
segredos da profissão:
fazer fogo sem tição,
assar carne no mormaço,
ou pialar de todo laço,
nos dias de marcação.

E, assim, se fez índio chucro,
camperaço e destorcido,
homem guapo e conhecido
em todo aquele rincão.


Mas, dentro do coração,
algo sempre lhe dizia
que ele, um dia, deixaria
daquela vida de peão.

Trazia dentro do peito
uma vontade escondida
de mudar a sua vida,
indo morar na cidade;
pois, na sua ingenuidade,
pensava que um campeiro,
no cotidiano povoeiro
fosse além da realidade.


Um dia, encilhou o zaino:
bom preparo, bom arreio,
alçou o pingo no freio
e se perdeu campo a fora;
do tim-tim-rim das esporas
ficara um eco manheiro
de mais um índio campeiro,
que da querência ia embora.

Sumiu–se a figura alegre
daquele xiru gaudério;
ficou guardado o mistério
daqueles que ficaram.
Dias e anos passaram,
e o quera não mais voltou;
por certo que se arrumou,
como tantos se arrumaram.

Talvez na cidade grande,
onde existe tanto emprego.
Mesmo quem foi do pelego
há de tirar melhor vida;
ilusão que é perseguida
e apartada da verdade,
porque ao chegar à cidade
a espera é longa e sofrida.

Mas foi num final de tarde,
de um dia meio chuvoso,
na hora de pedir pouso,
como se diz pelo pago,
que surgiu um olhar vago
da peonada que mateava:
alguém se aproximava;
talvez, rondando um amargo.

Depois de um buenas tardes,
com as vestes esfarrapadas,
as melenas mal tosadas,
num jeitão de mês de agosto,
trazia estampado ao rosto
a saudade do galpão;
e até mesmo o chimarrão,
que já esquecera do gosto.

Ainda disse, ao chegar,
que, além de pedir pousada,
vinha de longa jornada,
e a fome já o dominava;
e o sinuelo que buscava,
da cidade onde sonhou,
espantou–se, se apartou
da tropa que repontava.

Depois que a peonada alegre
reconheceu o vivente,
no seu instinto experiente
foi dizendo aos companheiros:
embora seja matreiro
o que se chama destino,
jamais será citadino
quem nasceu chucro e campeiro!

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